Livros não mudam pessoas; parágrafos, sim. Às vezes, até sentenças. Ainda recordo
uma tarde, no outono de 1968, quando estive em uma livraria na Avenida Colorado, em
Pasadena, e li a primeira página de The Weight of Glory (O Peso de Glória), escrito por C. S.
Lewis. Ainda que eu não tivesse lido outra página, minha vida teria sido mudada para
sempre. Talvez possa resumir o que li em duas sentenças: “Somos criaturas indiferentes,
que brincam com bebidas, sexo e ambição, enquanto o gozo infinito é-nos oferecido; como
uma criança ignorante que deseja continuar brincando na lama em uma favela, porque não
imagina o que significa o oferecimento de um feriado na praia. Satisfazemo-nos com coisas
pequenas demais”. Quase trinta anos depois, ainda sinto o arrepio daquela descoberta e o
ímpeto de luz que me atingiu. Nada mais seria o mesmo. Apenas um parágrafo, e a obra
decisiva foi realizada.
Isso não é algo novo. Dezesseis séculos atrás, em agosto de 386, Agostinho estava
em aflição espiritual. Em um jardim de Milão (Itália), ele se lançou ao chão, debaixo de uma
figueira, e deu lugar às lágrimas, que jorravam de seus olhos: “Arranquei cabelos e bati na
cabeça com os punhos. Fechei os dedos e abracei os joelhos”. Em seguida, ele ouviu “a voz
melódica de um menino ou menina, não tenho certeza, que repetia em refrão: ‘Pega-o e lê;
pega-o e lê’”. Agostinho aceitou isso como “uma ordem divina para abrir meu livro das
Escrituras e ler a primeira passagem em que caísse o meu olhar”. Ele abriu e leu:
“Andemos dignamente, como em pleno dia, não em orgia e bebedices, não em
impudicícias e dissoluções, não em contendas e ciúmes; mas revesti-vos do Senhor Jesus e
nada disponhas para a carne no tocante às suas concupiscências”. Com duas sentenças,
toda a aflição foi desfeita. “Não tive qualquer desejo de ler mais, nem precisava fazê-lo.
Pois, em um instante, quando cheguei ao final da sentença, aconteceu como se a luz da
confiança inundasse meu coração, e todas as trevas de dúvidas foram removidas”.
Quanto a Lutero, sua vida foi tocada por intermédio de outra das grandes sentenças
do apóstolo Paulo – Romanos 1:16-17. Na vida de Jonathan Edwards, foi 1 Timóteo 1:17.
Para John Wesley foi o prefácio do comentário livro A Epístola aos Romanos, escrito por
Lutero. E poderíamos acrescentar outros nomes à lista. A verdade é que a leitura de muitos
livros pode ser semelhante a ajuntar pedaços de madeira, mas as chamas brilham de uma
única sentença. A marca é deixada na mente não pela queima de muitas páginas, e sim pelo
calor de uma sentença aquecida por Deus.
Minha oração é que Deus se agrade em tornar as breves leituras deste livro e
queimar uma sentença ou um parágrafo em sua mente. As meditações têm apenas duas ou
três páginas de extensão. Não estão arranjadas em ordem de assuntos. O que as mantém
unidas é uma busca por experimentarmos a supremacia de Deus em toda a vida. O meu
alvo é despertar e nutrir essa fome.
Prefácio do livro Uma Vida Voltada para Deus, John Piper, Editora Fiel.
Por João Paulo Freitas. Jovens Reformados.
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